Por Matheus Militão, advogado
Em 2 de outubro de 2024, uma pessoa de apenas 22 (vinte e dois) anos tirou a própria vida após ser submetida a um processo de “destransição” conduzido por um pastor que se afirma “ex-travesti” e defende a chamada “cura gay”.
A pessoa em questão nasceu do sexo masculino e, após se identificar com o gênero feminino, fez a trasição de gênero – ou seja, afirmou-se como mulher trans. Entretanto, por influências religiosas, acabou se submetendo a uma “terapia de conversão sexual” e, antes do suicídio, dizia ter passado por uma “reconversão”.
O que é “cura gay” ou “terapia de conversão sexual”?
A chamada “cura gay” ou “terapia de conversão sexual” consiste em uma série de procedimentos voltados à adequação à sexualidade ou à expressão de gênero considerada normal ou normativa – a heterossexualidade e a cisgeneridade.
Nessa prática, podem ser empregados diversos meios, a exemplo de hormonização, indução ao vômito diante de estímulos sexuais considerados incorretos, abusos sexuais “corretivos” e, até mesmo, exorcismo.
Mas é crime?
Atualmente, em outubro de 2024, a legislação penal brasileira não prevê o crime de “cura gay” ou de terapia de conversão, entretanto, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 5.034/2023, que visa equiparar essa prática ao crime de tortura, inafiançável e com pena de até oito anos de reclusão.
O PL 5.034/2023 foi proposto pela Deputada Federal Erika Hilton e tem respaldo científico, uma vez que há estudos da Psicologia que concluem que a prática em questão é uma forma de tortura que provoca sérios danos psicológicos e físicos.
De toda forma, quem estimular ou aplicar a “cura gay”, pode responder pelo crime de homotransfobia, tendo em vista que a administração de tal “tratamento” parte do pressuposto que as pessoas LGBTQIAPN+ são doentes – ou “endemoninhadas” – e necessitam de correção.
Caso administrada contra a pessoa que esteja sob autoridade, guarda ou vigilância, com finalidade corretiva, o que geralmente ocorre com crianças e adolescentes, o agente, ou seja, quem aplicou a “terapia de conversão”, pode responder pelo crime de maus-tratos, previsto no art. 136 do Código Penal Brasileiro.
E a Resolução nº 01/1999 do Conselho Federal de Psicologia?
Em 1999, o Conselho Federal de Psicologia publicou a Resolução nº 01, que determina não caber a profissionais da psicologia o manejo da prática tratada neste texto, uma vez que a homossexualidade não é doença ou perversão e, portanto, não pode ser objeto de tratamentos curativos.
A Resolução é deficiente, tendo em vista que trata apenas da homossexualidade, entretanto, por força dela, o psicólogo ou a psicóloga que aplicar a “terapia de conversão sexual” pode ser responsabilizado administrativamente, ou seja, punido pelo Conselho Federal de Psicologia, até mesmo com a cassação do exercício profissional (art. 21, Resolução CFP nº 010/05).
O debate sobre o tema indica que, infelizmente, ainda há muito pelo que lutar.