Por Matheus Militão, advogado
Na quarta-feira da semana passada (4), Deolane Bezerra foi presa preventivamente em Recife/PE no curso da “Operação Integration”, instaurada pela Polícia Civil do Estado de Pernambuco para investigar jogos ilegais e a suposta prática do crime de lavagem de dinheiro.
Na última segunda-feira (9), a advogada, empresária e influenciadora digital teve sua prisão preventiva convertida na chamada “prisão domiciliar humanitária”, por ter uma filha menor de 12 (doze) anos que necessita de cuidado materno (art. 318, V, CPP).
Entretanto, no dia seguinte (10), foi novamente presa, dessa vez por ter descumprido uma medida cautelar não segregatória, ou seja, uma das obrigações fixadas pelo Judiciário para a manutenção da medida domiciliar.
As prisões tomaram os meios de comunicação e muitas pessoas têm falado que, por ter sido presa, Deolane seria uma criminosa, mas não é bem assim.
O QUE É PRISÃO PREVENTIVA?
Atualmente, a advogada se encontra em prisão preventiva, uma das modalidades de prisão processual que pode ser decretada a qualquer tempo, em qualquer fase do processo ou da investigação.
Segundo o art. 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva pode ser decretada para a garantia da ordem pública, da ordem econômica, do bom andamento da instrução criminal ou da aplicação da lei penal, desde que comprovada a existência de crime e presentes indicativos de que a pessoa o praticou, devendo estar demonstrado que sua liberdade representa um risco às finalidades legais.
A DEOLANE PRATICOU ALGUM CRIME?
A legislação processual brasileira condiciona a decretação da prisão preventiva à existência de prova da ocorrência do crime e de indícios de autoria delitiva. Sendo assim, por enquanto, a partir da prisão preventiva, é possível afirmar que os crimes sob investigação foram praticados, entretanto, NÃO é possível dizer que a Deolane os praticou, pois tal afirmação só é possível a partir de provas, que, até então, pelo que se sabe, não existem.
De toda sorte, é relevante frisar que nem sempre quem é preso(a) preventivamente praticou algum crime, uma vez que, no Direito brasileiro, só é possível afirmar que alguém é culpado(a) após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ou seja, quando a pessoa é condenada e não há mais possibilidade de questionar a decisão.
Infelizmente, não é incomum que uma pessoa passe meses ou anos presa preventivamente e, ao final do processo, seja absolvida, tenha sua inocência reconhecida. Enquanto pesquisador em criminologia e em processo penal, deparei-me com o caso de um homem que passou oito anos preso preventivamente pela suposta prática do crime de furto qualificado e foi absolvido.
Assim, até o fim do processo, quando comprovadas as supostas práticas criminosas e não houver mais qualquer possibilidade de recurso, por força do princípio da presunção da inocência, Deolane é inocente e deve ser tratada como tal.
A PRISÃO DA DEOLANE É CRIMINOSA?
Ao deixar a prisão na segunda-feira (9), Deolane afirmou que sua prisão era criminosa e que constitui abuso de autoridade. É possível que suas afirmações sejam verdadeiras.
Nesse sentido, o art. 9º da Lei nº 13.869/2019 prevê que configura crime de abuso de autoridade a decretação da prisão ou de qualquer medida de privação de liberdade em manifesta desconformidade com a lei. Vejamos:
Art. 9º Decretar medida de privação da liberdade em manifesta desconformidade com as hipóteses legais
Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
O processo tramita em segredo de justiça, mas, caso a decisão que impôs a prisão for manifestamente contrária às disposições do Código de Processo Penal – por exemplo, caso tenha sido decretada sem que haja prova da existência do crime de lavage de dinheiro –, quem a decretou pode responder por crime de abuso de autoridade, com um a quatro anos de prisão e multa.
Que a justiça seja feita!